Caveirinha FC, o time que enterrava adversários no Recife
Desenterramos a história do time de funerária que metia medo por onde passava
Se os três grandes do Recife dividem o coração dos torcedores locais no futebol profissional, no amador poucos times foram tão queridos quanto o Caveirinha Futebol Clube. É o que garante o pernambucano Antão Costa da Silva, treinador da equipe que arrancava risos por onde passava – e metia medo nos mais supersticiosos.
O Caveirinha representava os funcionários da funerária Casa Baptista, do bairro Boa Vista. Na empresa, que chegou a contar com cerca de 120 funcionários, havia muitos fãs de futebol. Dois deles, Cremildo Figueiredo e Olavo Correia da Costa, já falecidos, resolveram fundar um time para a turma, em 1959. O nome foi o mais espirituoso possível.
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Durante 35 anos, o técnico do Caveirinha foi sempre o mesmo: Antão, o mecânico dos carros funerários. “Entrei na empresa no dia 6 de janeiro de 1964. A partir de então, conciliei o trabalho com a função de treinador, mas também quebrava o galho como reserva”, resgata o hoje auxiliar de vendas da Casa Baptista, onde bate o ponto há 52 anos.
A equipe nunca possuiu um campo próprio, jogando onde fosse possível. Mas contava com apoio da empresa, sobretudo do proprietário Luis Alberto Velho, também já falecido. Os veículos que levavam os amigos aos campos da periferia, por exemplo, eram os carros funerários. Mais um motivo para a aura que se criou em torno do time.
“Quando chegávamos aos jogos, era um acontecimento. Naquela época as pessoas tinham medo de quem trabalhava em funerária. Chamavam a gente de ‘time de papa-defunto'”, relembra o ex-treinador, hoje com 74 anos.
“Quando chegávamos aos jogos, era um acontecimento. Chamavam a gente de ‘time de papa-defunto'”. (Antão Costa da Silva)
A fama na várzea recifense chegou aos ouvidos da revista Placar. Em 1979, o Caveirinha ganhou uma reportagem de duas páginas e meia, além de chamada de capa. Texto de Lenivaldo Aragão, fotos de Silvio Ferreira. Na ocasião, os repórteres levaram o time para uma foto no cemitério de Santo Amaro, na região central da cidade.
“Muitos lá no cemitério se incomodaram com a presença de um time todo uniformizado ao lado dos túmulos, dizendo que aquilo era um desrespeito com os mortos. A gente precisou inventar uma história, de que a foto era uma homenagem a um amigo dos jogadores”, resgata Lenivaldo, jornalista hoje com 77 anos.
Repercussão nacional
A reportagem da Placar, que também foi a um jogo do Caveirinha contra o Campinense, outro tradicional time amador do Recife, espalhou o nome da equipe além dos campos de periferia.
“A gente ficou muito conhecido depois disso. Até a TV Globo fez reportagem sobre o Caveirinha”, gaba-se Antão. Esse reconhecimento levou a mal-entendido que rendeu uma grande dor de cabeça.
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Em 1987, o time da funerária viajou a Araçoiaba, a 50 km do Recife, para a festa de aniversário de uma equipe local. O Caveirinha assombrou a galera da casa, vencendo por 3 a 1. Na volta à capital, o carro funerário passou no exato momento em que houve um acidente na rodovia.
Daí, alguém ligou para uma rádio do Recife dizendo que o veículo do Caveirinha havia se acidentado gravemente. Estava feita a confusão. A notícia rodou a cidade e, dali em diante, choveu de ligação para a Casa Baptista. “Muita gente queria saber se havíamos morrido”, diverte-se Antão.
Em toda a trajetória do time, somente um caveirinha chegou a se profissionalizar, conta o ex-treinador. Foi Jober, menino que jogou no Náutico. “Éramos todos pernas-de-pau. A gente jogava por diversão, nos fins de semana e às vezes nas noites em dia de trabalho”.
Em 1999, Antão cansou, e deixou o comando do time. Faltou liderança na funerária para mantê-lo vivo. “A turma se desinteressou”, lamenta Antão. Depois de 40 anos de alegrias e tristezas, o Caveirinha teve o mesmo destino de tantos que o carro da equipe transportou.
Quer ler a reportagem da Placar? Clique neste link. As páginas são 42, 43 e 44.
(*) A dica desta pauta foi do pesquisador cearense João Ricardo de Oliveira.
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