Trilogia de clubes cearenses é relançada
Ano de Copa do Mundo é tempo de novidades no mercado literário esportivo. Os fãs do futebol cearense, por exemplo, […]
Ano de Copa do Mundo é tempo de novidades no mercado literário esportivo. Os fãs do futebol cearense, por exemplo, tiveram boa surpresa: o relançamento da trilogia sobre a história dos três clubes mais tradicionais do estado – Ceará, Fortaleza e Ferroviário –, do professor e historiador Airton de Farias. Se você pensa que são somente mais uns livros sobre futebol, está enganado.
São raros os pesquisadores que encaram a missão de resgatar a história de clubes rivais. Isso já denota que as obras de Airton não são mero relato apaixonado de conquistas. “Minha preocupação não foi de dizer ‘quem é mais glorioso’, ‘quem é mais vencedor’, acho isso entediante. Foi ver como esses times e suas peculiaridades podem ser entendidas historicamente”, explica.
A coleção havia sido lançada em 2005, com distribuição pelo jornal Diário do Nordeste. Na época, foi um sucesso, esgotando-se as 12 mil cópias (5 mil de Ceará e Fortaleza, mais 2 mil do Ferroviário). “Para o mercado editorial cearense, foram números excelentes”, salienta. Com isso surgiu o interesse do relançamento das obras, com necessários acréscimos de informações.
Com um texto diferenciado, cheio de contextualizações históricas, Airton mescla o passado dos clubes a fatos da sociedade. Assim, os três livros se tornam obra de interesse não apenas a quem curte futebol, mas também quem a gosta de política e história e tem curiosidade sobre como o jogo interfere nas relações sociais. “Abordo questões como racismo, uso político dos clubes, fragilidades das equipes”, lista.
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Então, se você cruzar com estes títulos em alguma livraria, vale a pena comprá-los: “Ceará – Uma História de Paixão e Glória”, “Fortaleza – História, Tradição e Glória” (assinado em parceria com o irmão Vagner de Farias) e “Ferroviário – Nos Trilhos da Vitória”. Cada um é vendido R$ 30, e a coleção completa por R$ 80. Aproveite e reserve mais um dinheirinho. Porque, depois de 30 livros lançados, Airton conta na entrevista a seguir qual a próxima novidade que chega às livrarias em abril.
Minha preocupação não foi de dizer ‘quem é mais glorioso’, ‘quem é mais vencedor’, acho isso entediante. Foi ver como esses times e suas peculiaridades podem ser entendidas historicamente”. Airton de Farias.
Entrevista com Airton de Farias:
Verminosos por Futebol – Algo particular a seu texto é a contextualização histórica, não só com fatos do futebol, mas políticos também. Você tem alguma inspiração em especial?
Airton de Farias – O historiador inglês E. Thompson diz que História é contexto. Então, é preciso tirar o futebol, os times de futebol, os jogadores da moldura, e entendê-los dentro das conjunturas das respectivas épocas. Então, nos livros, tento fazer isso, como ao tratar da origem do futebol local, abordando questões como racismo, uso político dos clubes, fragilidades das equipes. A rigor, à exceção do Maguary, os clubes sociais do estado não abraçaram o futebol – tivemos apenas times, frágeis, dependendo da ajuda de abnegados. Isso ajuda a explicar as dificuldades de nossos times em chegar à primeira divisão e se manter, por exemplo.
Verminosos – É muito raro encontrar historiadores/pesquisadores/escritores com esse nível de aprofundamento em temas políticos e esportivos ao mesmo tempo. Por que você acha que existe esse fenômeno?
Airton – Durante muito tempo, o acadêmico e o torcedor pareciam seres de planetas distintos. O primeiro menosprezava o “esporte das multidões”, vendo-o não raro como “ópio do povo”; o segundo se conformava com as informações dadas pela imprensa sobre o clube. Isso muda nos últimos anos. Hoje, é cada vez maior a quantidade de monografias, teses e dissertações sobre esporte, futebol. Muitos torcedores, por sua vez, buscam mais informações, para entender melhor a história de seus clubes e as contradições do futebol, que são também contradições de nossa sociedade, como a violência das torcidas, repressão, elitização do esporte, interferência da televisão nas competições etc. É incrível as leituras sociais que podem ser feitas a partir do futebol.
Durante muito tempo, o acadêmico e o torcedor pareciam seres de planetas distintos”.
Verminosos – Qual foi a principal dificuldade na pesquisa?
Airton – Falar sobre a história do futebol local é um problema, pela precariedade de fontes. Por razões óbvias, não há como tomar mais o depoimento dos primeiros jogadores (embora possam ser entrevistados seus parentes). Os times e a federação não se preocuparam em preservar os materiais. Os jornais davam pouca atenção ao futebol. O que se tem são muitos relatos de memorialistas e alguns jornais do começo do século XX com dispersas e pequenas notas. Então, precisamos ser muito cuidadoso nas análises – por isso, nas obras, há a constante citação das fontes, para fundamentar o que se diz. Sabemos como são usadas as memórias, na política, e no futebol também. Então, minha preocupação não foi de dizer “quem é mais glorioso”, “quem é mais vencedor” – acho isso entediante –, mas ver como esses times e suas peculiaridades podem ser entendidas historicamente.
Verminosos – É impressão minha ou as elites cearenses (econômica, política e cultural) nunca deram muita bola para futebol? Será que isso explica o estágio subdesenvolvido do futebol cearense?
Airton – Sim, essa é uma das questões que abordo nos livros. O Ceará, como um estado periférico do Brasil, nunca teve setores econômicos de expressividade. A fragilidade desses grupos dominantes é visível nas várias carências estruturais do Estado – imagine-se que um porto digno para Fortaleza só foi de fato funcionar nos anos 40, isso num estado de economia agromercantil exportadora. Então, o futebol não ficou imune a isso. O Campo do Prado tinha barro batido. A grande novidade do PV, quando inaugurado em 1941, foi um gramado e uma das preocupações da época seria saber se os jogadores saberiam jogar na grama. Então, o futebol é o que somos: um estado (infelizmente) pobre. Por isso, times pobres. Historicamente, tínhamos apenas times, sendo comuns, por exemplo, o atraso de salários (o que, por sinal, aconteciam por quase todo o futebol brasileiro). Por outro lado, era o dinheiro de homens ricos que sustentava os clubes. Desorganizados, na ânsia de obter títulos, esses dirigentes faziam gastos tresloucados, sem medir as consequências. Com tais gastos, os clubes continuavam fragilizados, dependendo ainda mais dos abnegados, num círculo vicioso.
O futebol cearense é o que somos: um estado (infelizmente) pobre. Por isso, times pobres”.
Verminosos – Nessa mesma linha, você está prestes a lançar um belo trabalho sobre Copa do Mundo. O que terá nessa obra?
Airton – “Uma História do Futebol: Copas do Mundo e Sociedade” deve ser lançado em abril, salvo algum imprevisto. É uma obra em dois volumes, mais de mil laudas, com desenhos do quadrinista Daniel Brandão, que tem vários trabalhos para grandes editoras do Brasil e dos Estados Unidos (Marvel e DC). O livro busca analisar as diversas sociedades nas vinculações com o futebol. Então há textos abordando o nascimento do futebol e sua vinculação com o capitalismo, o futebol nas duas guerras mundiais, o futebol na Cortina de Ferro, no nazismo, nas ditaduras da América Latina, no Apartheid da África do Sul, na Espanha franquista, o processo de globalização e o futebol, racismo, enfim, um livro de fôlego para quem gosta de história política e futebol – ou para quem gosta de futebol e história política. O livro se encerra nos protestos de junho de 2013, na Copa das Confederações, e no Bom Senso Futebol Clube.
É um livro pelo qual estou muito ansioso. Para quem acha que futebol é “ópio” do povo, será uma surpresa.
Perfil
Airton de Farias, professor e historiador, é um dos escritores de produção mais numerosa do Ceará. Já lançou 30 livros, sendo o mais conhecido “História do Ceará”, em 6ª edição pelo Armazém da Cultura.
Contato: airtondefarias@yahoo.com.br.
Serviço
A trilogia do futebol cearense é vendida no Armazém da Cultura (www.armazemcultura.com.br e 85-3224-9780). Além disso, os livros são encontrados em livrarias de Fortaleza, como Cultura, Saraiva, Lua Nova e Arte e Ciência, na Banca do Sobral, e também em algumas outras capitais.
Preço: R$ 30, sendo R$ 80 pela coleção completa.
Clique no link e leia também:
www.verminososporfutebol.com.br/dica-cultural/10-melhores-livros-sobre-futebol-que-ja-li
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