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Por que o Juventus da Mooca virou um clube cult e o Nacional da Barra Funda não?

Paulistanos explicam os motivos que tornaram dois clubes de bairro de São Paulo tão diferentes

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Os bairros do Juventus e do Nacional explicam o que os clubes se tornaram (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)
Os bairros do Juventus e do Nacional explicam o que os clubes se tornaram ao longo do tempo (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)

O Juventus e o Nacional, clubes pequenos de São Paulo, estão distante 10 quilômetros um do outro. O primeiro na Mooca, na Zona Leste; o segundo na Barra Funda, na Zona Oeste. Ao longo das décadas, ambos viraram times de bairro. Sem representação e torcida por toda a cidade, como o trio de ferro Corinthians, Palmeiras e São Paulo, ou mesmo como a Portuguesa. Apesar disso, nos últimos anos o Juventus adquiriu um status de clube cult, expressado pela frase “ódio eterno ao futebol moderno”, às vezes estampada em camisas e bandeiras em seu estádio. Virou local de peregrinação de paulistanos e gente de outras cidades e estados. Enquanto isso, o mesmo não aconteceu com o Nacional. Por quê?

Relação com o bairro

O Verminosos por Futebol, curioso sobre essa diferença entre os dois times, questionou o motivo a alguns jornalistas e torcedores paulistanos. Para todos, o bairro onde está localizada cada sede explica a questão.

“O Nacional, vizinho do Palmeiras, nunca teve ao seu lado um bairro como a Mooca, que como bom reduto de italianos, orgulha-se muito de suas tradições. Entre elas está o Juventus”, atesta o jornalista Celso Unzelte, um dos consultados.

Confira abaixo as análises dele, do jornalista Marcelo Duarte e dos torcedores Hamilton Kuniochi (Juventus) e Deivid Silva (Nacional).

O estádio do Juventus da Mooca virou local de peregrinação entre fãs de futebol (Foto: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)
Estádio do Juventus virou local de peregrinação (Foto: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)

“O Nacional nunca teve um bairro ao seu lado como o Juventus”

 

Nacional e Juventus são os últimos sobreviventes de uma era em que os clubes da capital eram maioria no campeonato. Internacional, Germânia (hoje Esporte Clube Pinheiros), Sírio, entre outros, não resistiram ao profissionalismo. Comercial e Ypiranga, em um segundo momento, não resistiram à interiorização promovida a partir de 1949, com a Lei do Acesso e a chegada dos XVs de Piracicaba e Guaranis da vida, todos com uma cidade e, consequentemente, uma torcida atrás de si, coisa que os pequenos da capital nunca tiveram.

Especificamente sobre esses dois, a verdade é que o Nacional, da Lapa/Água Branca, reduto do Palmeiras, nunca teve ao seu lado um bairro como a Mooca, que como bom reduto de italianos, orgulha-se muito de suas tradições. Entre elas está o Juventus.

Acrescente-se também que as memórias de um Juventus forte, Moleque Travesso que aprontava contra os grandes (principalmente o sofrido Corinthians dos anos 60 e 70), é muito mais recente que as do SPR/Nacional, que além de não ter grandes histórias para contar nesses confrontos ainda jogou a primeira divisão pela última vez em 1959. É preciso ser pelo menos um septuagenário para ter alguma lembrança sobre o time nessas condições.

Outra coisa: essa história de clássico Juve-Nal, assim como a rivalidade entre o Juventus e a apequenada Portuguesa, é recentíssima, fruto da percepção que temos dessas coisas hoje. Nos tempos em que jogavam a primeira divisão juntos, o encontro Juventus x Nacional era tão (ou até menos) importante que Juventus x Ypiranga ou Ypiranga x Nacional, por exemplo. E o jogo da Portuguesa contra o Juventus não passava de um encontro de um grande (ainda que o quinto grande, ou, pelo menos, um clube claramente maior que o outro) contra um pequeno. Nível de América x Bangu ou América x Olaria no Rio de Janeiro.

> Celso Unzelte é jornalista, escritor e professor universitário.

O bairro do Nacional nunca abraçou o clube, a exemplo do Juventus (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)
O bairro do Nacional nunca abraçou o clube (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)

“Os moradores da Mooca têm uma identificação muito forte com o bairro”

 

O pessoal da Mooca tem uma identificação muito forte (até histórica) com o bairro, ao contrário do Nacional, que fica na Barra Funda, uma região que só começou a ganhar prédios agora. Quando você atravessa a ponte que liga o Centro à Mooca, existe uma placa “Bem-vindo a Mooca!”. Há até uma praça chamada “Eu Amo a Mooca” bem perto do estádio. O Juventus passou a ser o segundo time do pessoal dali. E contou com a ajuda da história dos cannolis em dias de jogos (que começou a atrair até quem não gosta de futebol) e a esfirraria que fica ali perto. Acabou virando quase uma atração turística.

> Marcelo Duarte é jornalista e escritor.

Praça "Eu Amo a Mooca" simboliza o sentimento dos moradores do bairro (Foto: Reprodução Google Street View)
Praça “Eu Amo a Mooca” simboliza o sentimento dos moradores (Foto: Reprodução)

“O Juventus virou sinal de pertencimento de um bairro”

 

Houve um grande aumento de interesse pelo Juventus, porém me parece que existe um foco diferente, que é de preservação e resistência, como se fosse um símbolo cultural de uma São Paulo que já não existe mais, engolida pelo progresso. Então não é só pelo time, embora o time precise sobreviver, também. A própria Mooca, com a especulação imobiliária, cresceu e começou a se apegar a esses elementos, tornando-se uma região muito bairrista. Isso passou a ser associado ao Juventus, conforme os novos torcedores foram trazendo referências aos operários da fábrica na qual o clube foi fundado e às origens italianas.

Vestir a camisa do Juventus é um sinal de pertencimento, de identidade cultural e social. Por isso a camisa se popularizou. Não é simplesmente por hipsterismo como as pessoas tentam simplificar. É mais complicado. Por isso também que está cheio de gente fazendo TCC na Javari todo semestre. Seja como for, o clube parece que começou a entender o seu papel e começou a se posicionar como uma bandeira do bairro da Mooca.

> Hamilton Kuniochi, de 33 anos, é funcionário público, torcedor e colecionador de camisas do Juventus e morador da Mooca.

O estádio e a sede do Juventus viraram referências para a Mooca (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)
Estádio virou referência para a Mooca (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)

“O Nacional paga por seu ostracismo e infraestrutura precária”

 

O Nacional hoje paga as contas de um largo período de ostracismo no futebol paulista, longe do primeiro escalão desde 1959, ano da sua última participação na divisão especial. Viu a derrocada do quadro associativo, quando o povo paulistano começou a migrar dos clubes nos finais de semana para suas chácaras e sítios no interior, shoppings centers e até locais públicos com piscinas ao ar livre, infraestrutura esta que os clubes forneciam através de títulos de sócios e benefícios internos. Com isso e aliado a uma parada no tempo, o que se vê hoje em dia pros lados da Comendador Souza é simplesmente um ar de nostalgia no qual alguns torcedores saudosistas são atraídos e levam amigos e parentes a assistir algum dérbi no estádio Nicolau Alayon.

O Juventus é um clube enraizado em um bairro residencial, a Mooca, o qual facilita o acesso de sua torcida. Possui uma referência gastronômica dentro de suas dependências, que é o canolli de seu Antonio, famoso em toda roda de futebol, e tem a maioria de seus jogos às 10h do domingo, o que faz com que o jogo não se torne um atrativo somente aos torcedores, e sim a famílias e turistas que estão de passagem na capital paulista.

Já o Nacional tem uma ideologia de não jogar em datas em que o Trio de Ferro jogue, por isso prioriza os sábados às 15h, horário esse porque o estádio não possui mais refletores para partidas noturnas. Juntamente com uma infraestrutura precária, o torcedor que vai ao Nicolau Alayon ver o jogo não possui muitas opções para comer e beber, além de banheiros que lembram os dos estádios dos anos 70, quando a fila era grande e o estrago era certo.

A média de público diante destes fatores é de 300 torcedores por jogo. E, se analisar bem, são poucos abnegados que ainda nutrem sentimentos pelo clube. A nova safra de torcedores (nascidos após 2000) em sua maioria desconhece o clube centenário da Barra Funda.

> Deivid Silva, de 34 anos, é comerciante, torcedor e conselheiro do Nacional e morador do bairro Freguesia do Ó, vizinho ao clube.

Infraestrutura do Nacional e do bairro não é atrativo para visitas (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)
Estrutura do Nacional não é atrativa para visitas (Fotos: Rafael Luis Azevedo/Verminosos por Futebol)

Perfil dos clubes:

Nome: Clube Atlético Juventus.
Bairro: Mooca, São Paulo.
Fundação: 20/4/1924.
Estádio: Conde Rodolfo Crespi (5 mil lugares).
Títulos: 2ª divisão nacional (1983), 2ª divisão paulista (1929 e 2005), Copa Paulista (2007) e Copa São Paulo de Futebol Júnior (1985).
Participações no Campeonato Brasileiro: 1ª divisão (1983), 2ª divisão (11 vezes, entre 1980 e 1998) e 3ª divisão (8 vezes, entre 1994 e 2007).


Nome: Nacional Atlético Clube.
Bairro: Barra Funda/Água Branca/Lapa, São Paulo.
Fundação: 16/2/1919 (oficialmente) e 14/4/1895 (extraoficial).
Estádio: Nicolau Alayon (10 mil lugares).
Títulos: 3ª divisão paulista (1994, 2000 e 2017), 4ª divisão paulista (2014) e Copa São Paulo de Futebol Júnior (1972 e 1988).
Participações no Campeonato Brasileiro: 3ª divisão (1995, 1998 e 2000).

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2 respostas para “Por que o Juventus da Mooca virou um clube cult e o Nacional da Barra Funda não?”

  1. O nosso nobre amigo Guilherme no comentário acima disse algo que não reflete com o fato. O Bangu tem a sua identificação com o bairro, mas existe mais a questão de parecer cult torcer para um clube que tem uma história importante na sociedade/esporte do que propriamente por torcer pelo clube. O America, sempre teve maior relevância em títulos no Rio e teve participações importantes na série A do Brasileiro. Obviamente o Bangu por ter sido vice-campeão em 1985 o colocou num patamar maior, mas só daquela vez. O America sempre teve mais torcida, mais vitórias em confronto direto e mais torcedores sem ser misto. O fato é que por estar há alguns anos na segunda divisão do estadual distancia as suas aparições pro público daqui, mas o America tem uma enorme tradição. O America é a quinta força do Rio historicamente, o Bangu vem depois.

  2. Falou bosta quando citou o Rio, só.

    O Bangu, vice-campeão brasileiro de1985, tem a maior torcida fora dos 4 grandes do Rio. É EXTREMAMENTE identificado com o bairro de Bangu (assim como o Juventus com a Mooca), diferentemente do América com a Tijuca. O América é um time turístico, sim, mas de relevância muito menor, há muitos anos, que o Bangu.

    Bangu X América é um clássico que decide títulos desde os anos 10 do século passado, com mais que o dobro de jogos que Juventus X Portuguesa na história.

    O Olaria nunca chegou a uma final.

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